domingo, 27 de setembro de 2009

"Tortura é crime hediondo, não político"

Por Christian Baines, para o site desaparecidos políticos

O presidente da Comissão de Mortos e Desaparecidos, o advogado Marco Antonio Barbosa, 61, defende a punição aos torturadores do regime militar brasileiro, pois considera que eles cometeram crimes comuns e não políticos. Segundo ele, se os agentes públicos não forem punidos, devem ser ao menos identificados claramente para a opinião pública como autores de violações contra a humanidade.
Barbosa afirmou que o texto da Lei da Anistia, assinada em agosto de 1979 pelo então presidente João Figueiredo, foi escrito de maneira dúbia justamente para incluir os torturadores como praticantes de crimes políticos.
"É público e notório que o legislador, com um texto obscuro, ao considerar crimes comuns como conexos [crimes por motivação política], teve o intuito de incluir no âmbito os agentes públicos. Porém, eles não praticaram crimes políticos. Não cometeram delitos contra a ordem social ou a segurança nacional. Com a pretensão de defender a nação, mataram, torturaram, desapareceram com pessoas e violentaram. Esses são crimes contra a humanidade", disse o presidente da comissão criada por lei em 1995.
O advogado disse ainda que a Corte Interamericana de Direitos Humanos declarou inconstitucional a aplicação da lei brasileira, na qual o Estado anistia os próprios agentes de sua administração.
"A definição de que homicídio e tortura são crimes contra a humanidade já foi julgada na Corte Interamericana de Direitos Humanos, cuja jurisdição é reconhecida pelo Brasil. Além disso, não existe a auto-anistia. O Estado não pode se auto-anistiar", afirmou Barbosa.
A Lei da Anistia, que completa 30 anos neste ano, beneficiou as pessoas que cometeram crimes políticos ou por motivação política entre os dias 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979, porém, excluiu aqueles que foram condenados por crimes de terrorismo, assalto, sequestro e atentado pessoal.
Segundo Barbosa, a controvérsia em relação à resolução voltou à pauta recentemente, pois a União não conseguiu reverter a decisão da juíza federal Solange Salgado, que determinou que o governo localize e entregue aos familiares os restos mortais dos militantes da guerrilha do Araguaia.
Além disso, o advogado lembrou ação cível proposta pelo Ministério Público Federal em São Paulo neste ano que pediu a condenação de servidores públicos estaduais por envolvimento na tortura e assassinato de um operário.
"Por causa da redação capciosa, há essa controvérsia. Esta é uma interpretação falsa da lei. Tortura é crime hediondo, não é crime político", afirmou o advogado.
Quando perguntado se os militantes de esquerda que praticaram torturas ou cometeram homicídios também deveriam ser punidos, o advogado desconversou. "Homicídio é uma coisa diferente de morto durante combate. Não pode generalizar. Além disso, não conhecemos casos de militantes que praticaram tortura, mas sabemos quem são os agentes que torturavam ou mandavam torturar.

Buscas no Araguaia



Presidente da comissão há três anos, Barbosa faz parte do comitê com 33 integrantes militares e civis que foi criado para ajudar no trabalho de buscas dos corpos de guerrilheiros do Araguaia. Segundo ele, a procura é fundamental para a conciliação nacional, para "que seja colocado um ponto final nessa história".
"É um anseio legítimo dos familiares que sofreram com a morte e ainda sofrem com a ausência dos corpos. É preciso descobrir, identificar e enterrar os mortos. Todos têm direito de prantear seus mortos", disse.
Os guerrilheiros do Araguaia se concentraram na região do Bico do Papagaio --sudeste do Pará, sul do Maranhão e norte de Goiás, hoje Tocantins-- na primeira metade dos anos 70. O grupo começou a chegar na região na década anterior e foi extinto em 1975, após repressão das Forças Armadas.
Todos os recursos da União contra a decisão judicial de 2003, de Solange Salgado, fracassaram. Então, para cumprir a ordem de localizar e entregar às famílias os restos mortais dos desaparecidos, o Ministério da Defesa montou a comissão de buscas, que conta com apoio logístico da 23ª Brigada de Infantaria de Selva.

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